quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Na Terra do Sol é Fácil Queimar ou a Ebulição?


Um texto de Mariana Tezini, para acarinhar o requentar da marmita amiga.

Apreciem no calor de fim de verão... a voz é sua cumadi.

"De dentro pra fora. É assim que se deve começar uma carta, um suspiro ou qualquer movimento.

Eu quase desconfio de tanta paixão que há em mim, mas pouca força pra dar a ela o que comer, não é a toa que tem Vênus demais no mapa astrológico e nenhum Marte. Nenhum. Bem, mas também me falta a água canceriana e nem por isso sou menos movida a dramalhões, não dá pra confiar plenamente neles.
Veja bem, Colombo descobriu terras novas, mas o que tentava mesmo era alcançar as terras indianas e suas riquezas. Os mapas não estão prontos, eles vão sendo construídos a cada morte e renascimento que colecionamos.
Como filha adotiva de Iansã eu não sei me defender sem atacar, daí eu coloco a minha espada bem perto do pescoço alheio e recito o rap “Quem mandou tu desacreditar, disse que ia voar mas nem saiu do chão. Escuta bem o que os neguinho vai falar, pra que cerol se tu não sabe laçar?”. O rap combina com essa cena. Negros, rappers e orixás.
Lembro da tatuagem ainda não feita, mas muito bem gravada “o fogo anda comigo”, quem tem curiosidade sobre a misteriosa morte de Laura Palmer sabe bem do que eu falo, em inglês acho tão gostoso de ouvir “fire walks with me”. Mais gostoso ainda é ser lembrada pela minha irmã num de seus belíssimos escritos, ela ainda tem medo, eu entendo.
Já dizia o tal mapa dos astros, me falta o elemento fogo. E a gente sempre arrumando um jeito de dar um nó na vida. Então vou marcar na pele a espada de fogo de Iansã e esse lembrete aí, que é pra contornar a problemática da falta.
E a gratidão, por onde anda? Ela anda em todos os lugares se tivermos atenção. Nesse cortejo sem pretensão que me faz olhar pra cada história que meu corpo conta, taí. Nisso tive ajuda das artes da minha irmã, redesenhei o corpo que eu possuo, nas cores mais bonitas, os traços são largos e o que sobra é a beleza no papel.
Mas somos todos estetas a observar os quadros na parede, com aquela mãozinha segurando o queixo, a famosa “cara de conteúdo” e quando nos deparamos com um corpo real o que fazemos? E quando recebemos um convite de realidade, não é mais confortável continuar na fantasia?
Vingança é um troço feio. Mas eu dou um dedo se ninguém nunca traçou como meta que aquele outro (o recipiente das carências) morresse de vontade. Só isso. Que nem a vontade de ter um carro com ar condicionado no verão de 40º quando entramos no carro estacionado no sol, mas nenhuma vontade tem tanta força a ponto de materializar ali o refresco. Então agora a meta (área de vendas usa muito essa palavra, né?) é fazer o outro passar vontade de se refrescar no verão. O toque de mestre é ficar de tocaia espiando a cara de vontade do vendedor de sonhos. E imaginar que isso basta. Porque no fundo a gente sabe que não basta.
Só sei que nada sei. É na hora da raiva que a gente afia a mente e faz umas crueldades mentais, adoro bolar planos mirabolantes. Dai lembrei-me de outra canção, que o cantor de voz rouca, sotaque nordestino arrastado e toques eletrônicos me empresta pra eu cantar assim no seu ouvido idoso “amarelou, mangou de mim/ não vai ficar de graça/ e dentro dessa caixa/ um corpo indigente/ um corpo que não fala/ um corpo que não sente.”

E lembra por onde anda a gratidão? Tanto amor conectado. A yogini me falou para esfriar e preservar, falou até um nome daqueles difíceis de escrever, se conectou comigo.
E a mulherada vermelho sangue? Todas lá com sua porção do céu e inferno pra me ofertar. Deusas.
Da irmã das artes, palavras preciosas e inspiração.
Está na Roda da Fortuna, tudo acontece no tempo certo. 

Tudo é transitório e tudo é eterno."