domingo, 29 de junho de 2014

De perdas, Chuletas e Restauros

Apesar de fazermos tudo funcionar, as vezes dá pau.

Quando meu sono dá lugar as vozes, minha cama vira espaço pra dança solo, numa luta pela tranquilidade noturna incapaz de deixar as imagens mais recentes: se faz a hora das três produzir ferramentas pra amenizar o que nos impede de avançar.

"Na casa do meu avô tem cheiro de rosa branca, defuma, defumadô, a casa do meu avô";

Era noite, o candomblé rolando lá embaixo e eu na casa que fora minha na primeira infância, aguardando acabar. tentava dormir mas era frio, olhava para o teto e via a cor escura da umidade que tomava mais e mais. Meu avô não fez telhado, na laje a água infiltrava, fez vida no cimento. Em Diadema, perto da represa, lá em Eldorado, Vila Paulina é úmido e frio demais de noite. Não tinha nada pra fazer, ouvia os tambores, e comecei a ler os nomes dos livros, da estante curvada, abaloada já com o peso das coisas.
Tinham imãs, pedras, revistas, uma televisão velha e o gravador.
Ouvi coisas esquisitas, ouvi uma voz rouca e baixa, não entendi nada, era voz masculina.
Me encantei com o aparelho e coloquei no bolso.
Acabou o candomblé, de madrugada, raiando o dia, tomaram café os participantes e eu fui embora com a minha avó, voltamos pra casa.
E não é que deu pau?

O Chuleta era ruim, menino que era daqueles que batiam em todos mundo, a gente era menor que ele e ele passava a mão nas meninas, tínhamos uma mistura de raiva e medo dele na escola. Era bem branco, de olhos puxados, cabelo curtinho, cheio de sardas, magro, alto. Dava medo do olhar dele com sorrisinho de canto. Foi ele que sumiu com o gravador da minha mochila.

Nesta e nas minhas outras ladronagens, a pior parte é a sensação que estão a te pegar, vão te tirar a alma (apesar de saber que vão te devolver), vão queimar tuas mãos no fogão como a Lucinha fez com o Pico, com o Pelé ou como a Vó Lice fez com o Mauro. E você parou? Nem eles... Nem eu.

Não queimaram minha mão, nem bateram, mas me destruíram um pouco por dentro.
Eu queria dizer que não foi de maldade, só peguei porque era legal ter um gravador, não tinha erro.
Eu queria contar isso ao meu avô que ta agora no Hospital São Paulo, apesar de saber que ele nem vai se lembrar. Queria que ele desse uma risada dessa história. Ele já me abençoou depois disso, fazem muitos anos e eu acho que não roubei mais nada de lá, apesar de ficar encantada com tudo que ele representa, apesar de cada vez que eu ia visitá-lo ter vontade de chorar (meu irmão e prima sentem a mesma coisa, uma comoção ao ver meu avô no Axé).

Meu tio quando soube o que fiz, me disse coisas muito duras, ele também não se lembra. Eu lembro.

Eu só queria dizer que o peso das coisas, nem sempre é o que pensamos que é.
O valor não é sempre o mesmo pra todos.
A conexão que criamos com aquele que afetamos é algo transtornador, tanto quanto ter sido lesado, ter perdido algo, ter tido sua pele queimada, no fundo dependendo quem você atravessa o caminho, não será mais o mesmo. A marca estará sempre lá pra você se lembrar.
Kamikaze, vejo cabeças em bombas rolando.
Com fibra! Sempre! Aqui é guerra, dá medo disso também.

Por isso nos isolamos num mato simbólico, emudecemos, tornamo-nos mais bicho.
Assim nos protegemos, silenciando, entrando na terra, depois do sangue nas mãos e no chão.
Nossa natureza é assim. Não arriamos, a gente não perde, aqui se grita e se chora, se afasta e o tempo leva. A água que faz sujar paredes também limpa parte da consciência e assim a barriga chama de volta.







sexta-feira, 27 de junho de 2014

Ladronagens, Guerrilhas vietnices, Códigos de conduta

Bye Bye Brasil, Lord Cigano na sua performance mais real diz ( e eu assino embaixo):

"esse negócio de amor dá pra improvisar, sacanagem tem que ser muito bem administrada"

Fui buscar todas as atuações onde a rapinagem se fez presente em nome da presença, abrindo mão da hipocrisia, fazendo jus a natureza de guerra como meu tio diz que nossa família faz parte observando o leito de meu avô.

1999, provavelmente os primeiros encontros com a tendência a usurpar o lugar das demais participantes desta historia a ser dissecada, lembro do Carlos Tadeu e do Rubens e mais tarde do Thiago, sei que indicava uma nova era do ficar e da malhação... ou seja, ninguém é de ninguém. As tardes na Pontengi, perto do Bura, a ida no Ballhaus, boicotando as aulas do Jean Mermoz. As minhas rivais que também foram amigas me contataram a pouco, lembrando os velhos tempos, me apontaram como sendo uma boa sedutora de menores.

2000 a 2004, tendo mudado de bairro e escola, a presença marcante fora as aventuras adolepeixes foi daquele que por muito tempo não pude pronunciar o nome, aquele que além de confiança religiosa, conferi ares paternos, muita mistura para pouca idade ou muita no caso dele. Nos últimos anos de contato tudo se tornou mais tenso e sério. Não fui mais vista como visita amiga e sim como (prazer é todo nosso!) Destruidora de lares.... daqueles sem estrutura e que já eram destruídos por si mesmos...

Lembro de em 2005 ter casado (risos) com quem tinha sido o namorado passageiro ainda que de passagem, assim passando... de uma pessoa amiga.

Na saída eis o encontro com novamente o passo a passo das descobertas juvenis com ares de ex-senhora. Aqui registradas inclusive. Foi a jornalista ou a dançarina...?
Enfim me conferiram o apelido de  Jovem Senhora, caiu como uma luva ou uma mini saia.
Dali foram inúmeros casos de família, que o SBT não registrou nas suas tardes escandalosas.

Como o profissional Lord Cigano e sua companheira (mais profissional ainda Salomé) resolvem se reerguer, eu o fiz...
ao choro, sangue, dores de corno e inchaço nos olhos de ressaca do "Fabio Júnior" e de Capitu, seguimos em frente, montamos uma banda, dançamos, pintamos até.

Mas acima de tudo, a base do prazer.
E esse prazer no sacrifício, na culpa, no esquivo, na saída pela tangente, da direita...que cansa.

Sabe como nos contos onde feiticeiras se escondem em vales, florestas, espaços afastados para dedicarem-se aos seus saberes mais profundos? Das ervas, dos encantos, dos amores, dos olhares, das dores, da solidão, das rugas, do tempo e do silêncio.
E no rolê com outras pessoas... assim se desfez. Algumas vezes pedi perdão, mas não é possível alcançar o raio todo, nem todos sabem. Quem acha que sabe usa de intuição de "oreia".

E o bom de tudo é ter tempo pra isso. Pra sugerir reerguer-se, reescrever-se, reinventar-se.
Pra ser também currada simbolicamente. Tamos ae brésil.

Prestei atenção e pesquisei os códigos de conduta.

A pouco prestei atenção como cientista. Observei, verifiquei, questionei, classifiquei, generalizei, defini e apliquei. Operações intelectuais para a tal construção de conhecimento. Dá-lhe trabalho, nos casos de furto que pesquisei, aqueles que responderam citaram uma questão infantil ao furto/afanar...
eram revistas em quadrinhos, brinquedos, chicletes dentro de rolos de papel higiênico, produtos que não gerariam falta ao dono. Porém o que mais me chamou atenção foi o fato de diversas pessoa não responderem e as que me responderam pessoalmente, também relacionaram o furto a algo infantil. Ou mesmo quando a resposta foi desviada para outros sentidos ou a não existência de uma situação de furto.
A conclusão é que é impossível de não acontecer...  ´abrangente concordo, mas "confessar" dá o tom de humanidade que dignifica a expectativa de outros e pesa na consciência de muitos.

São muitas sugestões que homens e mulheres tem que lidar diariamente em busca de desejos múltiplos que ainda que doam em em alguns corações ou acima deles doam em egos endurecidos possam ser julgados e condenados em eterna sentença condicional. Isso é morte sem direito a reencarnação.

Em catalão, fazer-se prestar é estar disponível a fazer algo por outrem...  Acho que a gente presta sim.

Tina (ritmo tradicional guineense) , na lagoa o espaço mais democrático para resolução de conflitos, aonde em paz pode-se esquecer e deixar com que o rio leve e assim se desenvolverem. Pra nos desenvolvermos precisamos nos conhecer, uns aos outros.

"Você pode amar uma águia, domada ou selvagem?
Domada ou selvagem, você pode amar um monstro de nome assustador?
Ninguém ama uma criança genial
Liberte-a...
E deixe sua alma correr solta."


segunda-feira, 28 de abril de 2014

Heranças? Estratégias ou Não ser forte pra não ficar só?

A cada mil lágrimas, sai um milagre?

meus olhos estão ardendo, não há milagre e sim claro sonhos de monte, aos montes, aos trancos e descendo barrancos, subindo ladeiras de preguiça com a linguiça, mostrando para cachorros e correndo até.............................................. dar aquela dorzinha no baço.

Mas você é forte.

Eu ouvi isso quando fui separada da minha vida a dois.
Eu ouvi isso quando reclamei de sei lá o que da vida pra não sei quem.
Eu ouvi isso na terapia.
Eu ouvi que eu tive que lutar muito pra estar aonde eu estava e ter o que eu tenho.
Apesar de não ter herança.
Apesar de dizerem que minhas armas tem que ser guardadas.
Minha guarda tem de baixar.
Mostrar que preciso de ajuda
Mesmo que eu deteste vítimas. Detesto gente que se queixa.  Sendo intolerante com choramingos.
Me sinto vítima, daquelas piores, chorona, cansada e sozinha.

A vitimização perfeita, daquela que você leva afago no rosto, carinho e condescendência.
Aquela que não querem te deixar dormir sozinha, porque ta frio.

Será que ser frágil, falar manso, "seja meiga, seja objetiva, seja faca na manteiga" me concede um lugar ao sol?

Ser forte e meiga. Guerreira e não mandar. Querer e não poder. Alegoria de semana, pré feriado.

Até hoje não entendi qual buraco as fadinhas, brancas, frágeis de cabelos louros e vermelhos, com faces róseas, olhinhos apertados e voz suave conseguem que eu não consigo.

Eu também queria um muffin desses... quem não? quero, como, lambo os beiços, tomo pra mim e ponto. Do que sobra esses docinhos fofos? Que tem mais além do chantilly e açúcar?

Cavalgo em tempestades, euforias rachadas, navego no Nilo. Amo tudo, amo mesmo. Amo gostoso. Raspo o prato, viajo, passo esponja, bato bolo e faço filho e escovo o corpo todo, tiro o sapato.

Quero que fique.
Se eu perguntar se sou boa, eu sei que sou, não precisa dizer.
Se falar que eu mexo gostoso, eu também sei. Sei tudo, sou petulante mesmo.
Me cala com calor.

Não some.

O que mais é preciso fazer?

Disse um dia o Jo:              dê menos.
Disse um dia o Mazarão:            dê, dê, dê, dê.    
Disse um dia o Duende:                     dê amor Arê.

E como eu fiz.....

Rastro disso na comida, no desenho, no não, no olhar, na cama, no cabelo, na palavra, no cheiro das dobras dos joelhos.

Mas pra que fazer propaganda? Disso eles sabem melhor que eu.

Soube que na lagoa, uma certa comunidade, mulheres bijagós podiam enfim falar, na Tina, cantavam umas as outras sobre estarem como estavam, no momento em que lavavam utensílios e roupas, cantavam, se estavam a dormir com o homem da outra, se sofriam por isso, qualquer angústia, era cantada e ainda é, na água da lagoa, na água da piscina,  lavando, deixando ir, batendo nas cabaças, dançando nas Tina´s, sabias, assim como as nossas lavadeiras, cheias de ladainhas.

Sem eu gritar, sem clamar em voz alta, minha abuelita me ouviu, sentiu de longe, pensou em mim o dia todo, me fará banhos, me lavará, mesmo sem herança, mesmo chorando do lado de lá da linha, que o lá não é muito longe, mas os sonhos são, os sonhos são.

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Detalhe Mulher Bijagó, abril 2014









quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Sussuarana, sonhos de quarentena ou abril e fechou?

Tenho escrito, pelas noites, na verdade pelas manhãs.

Lá eu te percebi, ignorante, ágil e asiático.
Numa ocê voraz, num tamanho que eu conheço, eu balancei tua saúde. Tua memória que em mim faz-se mais a verdade. Teu corpo eu balancei. Mostrei a moça que te falava mal. Minha testa sangrava e ainda assim eu gozava em te ver. E hoje é assim, continua.

Sei que a ignorância, é sua parceira. Sei que você goza de tê-la ao seu lado. Faz-se imprescindível ser assim. Apesar de me ensinar, o tempo todo. Me coloca na linha e nem sabe.

Me receitou remédio, me disse pra observar e eu clara das minhas funções...
Penso em você todos os dias onça.
Eu que pensei que descansaria na sua loucura.
O amor.

Te encontro na festa de sei lá o que e onde.
Sabia que demoraria mais um semestre.

E o inconsciente longe, perto... ta todo dia, boca dizendo que ce ta perto. Não só boca mas astro, cheiro e imagem. Quem sabe até pelo, Eneida que o diga. Que me chamaste numa manhã destas que doce nos deleitamos. Feito doce de leite.

Esses sonhos são comidos por pássaros da madrugada, as feiticeiras.
Na segunda minha barriga doía de saudade, de vontade da sua presença aqui dentro do meu corpo.
Eu tive que orar por nós dois.

Por mandingas e maleitas....
As "sumanas" que ce num volta.... menino. Que falta você faz. A Nana, Bethania e eu cantamos.
Fumei o caminho, o arresseio....

Hoje foi o dia de colocar a chave num favo de mel numa fechadura.
Sei que gosta das chaves.
Lembra que lembrei forjar?


segunda-feira, 29 de julho de 2013

A Chave Forjada? ou As aventuras valem a pena quando sua alma nem de perto é pequena? ou Dando menos e ganhando...?

Ai você que me rompe a pele em flor:

Taí, as referências são muitas, podemos partir das premonições que os planetas, as estrelas e o tarot nos enviam, todos os dias... adoro quando alguém chega contando que jogou nas runas (pela internet) e que falaram 'x', 'p', 't', 'o'.... E sem dúvida, Hollywood me ilude man!

É como uma música que ouvia muito, mas muito e inclusive mandei pro ex marido... Nara Leão com voz bêbada... Chico navegando.. o piano. 

Claro que consta que nada vai nos separar.... tenho lido o evangelho, quase que regularmente.
Seguindo dogmas, bulas... 
E o calendário anda nos atrapalhando.... rs
Eu chorando.
Mandei minha mãe se danar, gritei com ela agora, no telefone... tive dificuldades de entrar no blog...
To tomando aquela heineken, grande heim... (uma vez durante alguns meses guardei uma pra você, nem abri... até aquele abril.)

Lembra que eu disse que era até abril? Pois é... coisa de artista, macumbeira, cigana, conselhos, feiticeiras, de garota que acha que é e 'azveis' nem é... Mas há de ser.

Fuçando eu acho, eu vejo.... os pic nics (adoro a palavra, só acho que podia ser "pique e nique", mais gostoso) ahhhh o que eu vejo? Eu sendo a gata do pique, no vinho, na cerva, no queijo e na prata da foto.

E falamos tanto sobre tatuagem...  é marca. Quase baleiei-me por sua causa. Você mestre Jonas... Eu era o furo por cima da cabeça da baleia... que dá caminho a saída, ao ar puro do mar.... Por isso não quero ficar no seu corpo e só. É pra ouvir a tatuagem do Chico, cantada pelo Caetano. é pra curar a ferida, pra ser mais água que deixa ir embora o que já não serve e ficar a raiz na terra. 

Não é só 30, 4, 2, todos os  dias... são os rabiscos nos muros, no sol. Se tiver disposição a chuva também, pode ficar na coberta se preferir.

Dane-se aquele abril. Já era mesmo.... Você é mais viril.
Tem me consumido, bandido.

Meu cristo diz, que estou pra o que der e vier.... quase zomba. 
E eu na cartilha de resignação.... resignação, resignação, resignação.

Eu vejo os amores de minha irmã, sua resignação, sua beleza, ela lá na terra do sol, eu aqui na garoa. Eu vejo a prima que tem menos dez, na mesma situação, de beleza pura, pouco ingênua, da terra da água que salga, eu vejo a que gosta da Bahia e que vez ou outra torce o nariz, eu vejo a minha mentora que indiamente faz-se com 17 anos a mais, eu vejo a dos sétimo andar, eu vejo a que cria uma cria que não fala, eu vejo a que põe aplique pois é careca, eu vejo a que tem nariz menor e ainda é virgem, eu vejo a que quer que eu a faça corna junto ao marido, eu vejo as várias facetas das mulheres. Dobram, desdobram todos os dias e não entendem nada, muito menos eu.

E eu tendo que dar menos.
Dar menos.
Dar menos.
Dar menos.

Mais amor, mais resignação, mais carinho, atenção, mais o outro lado da cara, mais cerveja sola, mais vinho sola, mais cigarro sola, mais fogo no apartamento, mais luz de tieta, mais chega mais, mais pintura das paredes, mais bordados, mais café, mais trabalho, mais estudo, mais bertazzo, mais seguro fiança, mais escrever pra você, mais desenhar com você, mais você.

E se essa fosse pra mim?

 PROPOSTA DE AMOR 
Tom Zé
Ó garota,
Eu te convido para um novo tipo de amor,
Menos novela, muito mais solidário será,
A renovada confiança de ser
Que a mulher há de ter
Quando a senha do mistério digitar.
Assim será!
Ó garota,
Eu contra ti já inventei os deuses, a lei,
E pela carne do pecado te condenei
Tô convencido que essa guerra suja
Foi longe demais
E te ofereço um acordo de paz.
Assim será!

Em muitos países do mundo a garota
Também não tem o direito de ser.
Alguns até costumam fazer
Aquela cruel clitorectomia.
Mas no Brasil ocidental civilizado
Não extraímos uma unha sequer
Porém na psique da mulher 
Destruímos a mulher.
Agora estou a esperar
Uma resposta de amor e afeto.
Você de saia, eu de calça,
E o luar será nosso teto.
Uma cartinha de amor
Politicamente correta
Você de saia, eu de calça,
Felicidade será nossa meta.
Assim será!

Se assim fosse boa seria a história, a história, a história... da novela, dos movies, das músicas e do facebook.  

Ah! A chave, mandei forjar.....



quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Na Terra do Sol é Fácil Queimar ou a Ebulição?


Um texto de Mariana Tezini, para acarinhar o requentar da marmita amiga.

Apreciem no calor de fim de verão... a voz é sua cumadi.

"De dentro pra fora. É assim que se deve começar uma carta, um suspiro ou qualquer movimento.

Eu quase desconfio de tanta paixão que há em mim, mas pouca força pra dar a ela o que comer, não é a toa que tem Vênus demais no mapa astrológico e nenhum Marte. Nenhum. Bem, mas também me falta a água canceriana e nem por isso sou menos movida a dramalhões, não dá pra confiar plenamente neles.
Veja bem, Colombo descobriu terras novas, mas o que tentava mesmo era alcançar as terras indianas e suas riquezas. Os mapas não estão prontos, eles vão sendo construídos a cada morte e renascimento que colecionamos.
Como filha adotiva de Iansã eu não sei me defender sem atacar, daí eu coloco a minha espada bem perto do pescoço alheio e recito o rap “Quem mandou tu desacreditar, disse que ia voar mas nem saiu do chão. Escuta bem o que os neguinho vai falar, pra que cerol se tu não sabe laçar?”. O rap combina com essa cena. Negros, rappers e orixás.
Lembro da tatuagem ainda não feita, mas muito bem gravada “o fogo anda comigo”, quem tem curiosidade sobre a misteriosa morte de Laura Palmer sabe bem do que eu falo, em inglês acho tão gostoso de ouvir “fire walks with me”. Mais gostoso ainda é ser lembrada pela minha irmã num de seus belíssimos escritos, ela ainda tem medo, eu entendo.
Já dizia o tal mapa dos astros, me falta o elemento fogo. E a gente sempre arrumando um jeito de dar um nó na vida. Então vou marcar na pele a espada de fogo de Iansã e esse lembrete aí, que é pra contornar a problemática da falta.
E a gratidão, por onde anda? Ela anda em todos os lugares se tivermos atenção. Nesse cortejo sem pretensão que me faz olhar pra cada história que meu corpo conta, taí. Nisso tive ajuda das artes da minha irmã, redesenhei o corpo que eu possuo, nas cores mais bonitas, os traços são largos e o que sobra é a beleza no papel.
Mas somos todos estetas a observar os quadros na parede, com aquela mãozinha segurando o queixo, a famosa “cara de conteúdo” e quando nos deparamos com um corpo real o que fazemos? E quando recebemos um convite de realidade, não é mais confortável continuar na fantasia?
Vingança é um troço feio. Mas eu dou um dedo se ninguém nunca traçou como meta que aquele outro (o recipiente das carências) morresse de vontade. Só isso. Que nem a vontade de ter um carro com ar condicionado no verão de 40º quando entramos no carro estacionado no sol, mas nenhuma vontade tem tanta força a ponto de materializar ali o refresco. Então agora a meta (área de vendas usa muito essa palavra, né?) é fazer o outro passar vontade de se refrescar no verão. O toque de mestre é ficar de tocaia espiando a cara de vontade do vendedor de sonhos. E imaginar que isso basta. Porque no fundo a gente sabe que não basta.
Só sei que nada sei. É na hora da raiva que a gente afia a mente e faz umas crueldades mentais, adoro bolar planos mirabolantes. Dai lembrei-me de outra canção, que o cantor de voz rouca, sotaque nordestino arrastado e toques eletrônicos me empresta pra eu cantar assim no seu ouvido idoso “amarelou, mangou de mim/ não vai ficar de graça/ e dentro dessa caixa/ um corpo indigente/ um corpo que não fala/ um corpo que não sente.”

E lembra por onde anda a gratidão? Tanto amor conectado. A yogini me falou para esfriar e preservar, falou até um nome daqueles difíceis de escrever, se conectou comigo.
E a mulherada vermelho sangue? Todas lá com sua porção do céu e inferno pra me ofertar. Deusas.
Da irmã das artes, palavras preciosas e inspiração.
Está na Roda da Fortuna, tudo acontece no tempo certo. 

Tudo é transitório e tudo é eterno."


segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Bendita entre, "Extero - Corpo" ou maldita entre as irmãs.

E foi no encontro com o Astro, aquele do João Bosco que me tomou pelo bolero da pedra ametista.

Era lindo, parecia meu antigo marido, barba, branco, magro e póstumo ou quase.
No dia eu esperava o moço da rua, tava de cabelo curto, sem muita sensualidade.
Neste dia por acaso senti o ar me faltar (como aconteceu a poucos minutos na cama).
Tava menino na Bela Vista. Ele não era, nem foi meu.
Hoje ele foi.
Me abriu a carne em lágrimas e palavras escritas.
Me rasguei inteira, começou pelos olhos, seguiu pelo peito desnudo, enquanto descia lágrima pela barriga inchada de dor eu passava a mão e desfazia o caminho que eu já conhecia. Toquei minhas coxas frias pelo inverno que só chega de noite junto com as surpresas  e mistérios  que a tese de doutorado de Salloma fala.

Soube o ponto de partida pra esta inquietação, foi o Astro que me desembestou...
Continuo meio bestial sim. Menos força talvez. Bestial, casada com a solidão de labirinto.

Percebi que sou a próprio ser esquecido na ilha de creta. E como chorei, doído este abdômen, dói não ter amparo, não podia mais dormir.

Exponho todos os dias com requinte, educação ( a falta dela também), beleza, sensualidade essa massa que acompanha meu espírito.
Agora tão manchada e machucada, consigo dar voz ao que venho desenhando.

Aos 11 anos, sofri represália e minha tia e mãe confusas com a minha aparente sexualidade me disseram que era feio um menino da escola dizer que me achava bonita porque minhas coxas eram grossas. o nome dele era (ou é) Rodrigo, sarará, lindo... E olha que adorei o que ele disse. Mas não podia, era feio. Inventaram um causo que só era bacana namorar depois dos 18 anos. Risos! Elas nem se lembrarão disso...

Meu corpo é lindo, eu suspiro e desejo cada curva, cada estria, cada pelo crescendo, cada pelo encravado, cada sangue que corre, cada dobra que some e aparece.

É um presente.

Depois de tanta mutilação, depois de tanto socos que me dei na barriga quando ainda não entendia sua função, depois de tanta meia no sutiã, depois de esticar pra ser mãe, eu sou um regalo, um livro cheio de riquezas e luzinhas.

Eis que me deparo com a minha liberdade sobrepondo a vida alheia.
Eis que não posso comungar a minha matéria com minha irmãs de luta, aquelas que gritam pelo poder da mulher em quintais, livros, periferias, palcos e telas.

Me preparo com esmero, com cremosas misturas, perfumes desinibidos, brilhos, pele rígida, colorida e marcada.
A resposta é que passam como trens em cima do meu corpo, quase toda vez que me deparo com elas, que a princípio pregam que me protegem, eu, mulher, mãe, negra, nascida em periferia, compartilho o trabalho de educar, de fazer pensar e aprender... da saia colorida, da roda de jongo, da quebrada de quadril e do olhar forte. Guerreiras, dizem. Cheguei a ler que são até inocentes as minhas irmãs.

Nem trilhos tenho, o trem é rápido e demorado, são muitos vagões.

Algumas me tocam, brincam de beijar e aceitar depois de desfazer da minha imagem, me abraçam, me atiçam, me largam, me ignoram.

Os homens desejam mas ainda e não entendem a natureza do tal desejo.Treta na certa.

Não é comum se amar, nem se dar na colher como eu propus.

O jogo é duro, o Astro me diz que há lugar no mundo pra mim.

Eu peso e penso ser um circo de horrores.

Em destaque, sou a famosa alegoria. Nas grades, pra  aGRADar, assim combinávamos Tezini e eu.

Não é drama de meninice, é puro tete á tete.

 Ao te mostrar meu corpo desenhado, em paredes, nas fotos, ele é quase aceito. Foi a forma que achei de expandir pele, vontade, força e ainda querem contorna-lo, rasgar,esconder, rs.

O de carne e osso incomoda mais, é debate. Desde a minha casa, passando por saraus, parques, trabalho, até a cama do parceiro.
É sonho mal visitado. E por pouco ele que já cicatrizou não toma mais um baile de chibata.

Sofrer por sua sexualidade negada e clandestina, calada, doída, sangrada. Era pra ser sagrada... era?

No lugar da minha companheira de afago, um olhar de repreensão, chinelo no meio das pernas, piadas ofensivas.

As minhas irmãs, não são verdadeiras, não conseguem cumprir com seu propósito então seguem com as pilhérias, enfrentamentos e maldições.

Extero é pra fora, mas saindo, sem ser tudo que pode e deve. É processo. Estranha, tem entranha, dói.

Meu material físico 'a massa' é trabalho integral, desde que acordo, desde que decido como vou lidar com meu sexo, com a minha amamentação, com o meu cabelo e com meus cheiros, com meu parto e com meu aborto.

"..até eu fui obrigada a me respeitar (parte de uma frase da Lispector, sem palhaçada...)."

Doeu hoje e tem doído. Acho que sei qual o motivo, só  guardando porcarias dentro do meu recipiente íntimo, onde poderia ter uma criança crescendo, comida sendo digerida, sucos transformando... há sujeira que eu vou despejar em poucos dias.
Como fez João Lobo na história de Maria Condão; virou João das Águas Perdidas e eu Ariane das Águas Perdidas em Neves.


Ao Astro, boleros e nada/nunca mais.